[ANÁLISE] A CANÇÃO DE GELO E FOGO, profecias e o destino de uma casa (Rhaegar Targaryen parte IV)

A profecia do príncipe que foi prometido e as motivações de Rhaegar Targaryen
Rhaegar Targaryen


Enquanto muitos em Westeros acreditam que Rhaegar sequestrou Lyanna porque estava apaixonado ou porque só queria satisfazer os seus desejos, através de meistre Aemon vai se descortinando uma nova camada do Príncipe de Pedra do Dragão, que acrescenta mais um elemento ao mistério em torno desse personagem.

Meistre Aemon é nada mais nada menos do que filho do rei Maekar Targaryen e irmão do rei Aegon V, o Egg dos contos O Cavaleiro dos Sete Reinos, e o que podemos chamar de tio-bisavô de Rhaegar, Viserys e Daenerys.

Aemon Targaryen, em sua condição de meistre, é um dos personagens mais carismáticos de todas as crônicas, além de ser o personagem que Martin se esforça para construir a fama de homem mais sábio dos Sete Reinos.

Durante O Festim dos Corvos, em seus momentos finais de vida, o velho senhor revela ao leitor que manteve contato com Rhaegar durante um tempo e que acreditava que Rhaegar era na verdade o principal elemento de uma profecia já há muito tempo profetizada. A profecia do Príncipe que foi Prometido.

Quem é leitor das crônicas sabe o quanto as profecias são importantíssimas para o desenvolvimento da trama, talvez não seja exagero dizer que as profecias sejam a grande força motriz que move praticamente todo o enredo do mundo de gelo e fogo. Ela não engloba apenas palavras proferidas em forma de enigmas, mas sonhos e visões que se colocam como pistas para o leitor em relação aos grandes mistérios que permeiam a narrativa.


Desde o segundo volume, A Fúria dos Reis, temos conhecimento de uma antiga profecia, muito conhecida pelos sacerdotes vermelhos de R’hollor: a profecia de Azor Ahai. Um herói renascido do sal e da fumaça, que guiaria o mundo na luta contra o grande mal representado pelo O Outro, o grande inimigo do deus vermelho, R’hollor, durante a Longa Noite.

Conhecemos essa profecia por meio de um dos capítulos de Davos, que se passam inicialmente em Pedra do Dragão, e através de Melissandre de Asshai, a sacerdotisa vermelha que acredita que Stannis Baratheon é na verdade, Azor Ahai renascido.

“O velho meistre olhava para Stannis e via apenas um homem. Você vê um rei. Ambos se enganam. Ele é o escolhido do Senhor, o guerreiro do fogo. Vi-o à frente da luta contra a escuridão, vi-o nas chamas. As chamas não mentem, caso contrário você não estaria aqui. Isso também está escrito na profecia. Quando a estrela vermelha sangra e as trevas reúnem forças, Azor Ahai renascerá por entre fumaça e sal, para acordar dragões da pedra.” (A Tormenta de Espadas, Davos, cap. 25)

O mito de um herói surgindo e salvando o mundo durante uma longa escuridão, não era até então, algo desconhecido do enredo, já que o conhecemos logo no primeiro volume, A Guerra dos Tronos, através das histórias da Velha Ama com a história do Último Herói.

Porém é no segundo livro, A Fúria dos Reis, que finalmente ouvimos falar de Azor Ahai e mais tarde descobrimos que esse lendário herói e o Príncipe Prometido são na verdade a mesma figura profética.

“Nunca ninguém procurou uma garota – dissera – Fora um príncipe a ser prometido, não uma princesa. Rhaegar, pensava eu… a fumaça era do incêndio que devorou Solarestival no dia do seu nascimento, o sal vinha das lágrimas derramadas por aqueles que morreram. Ele partilhou minha crença quando era mais novo, mas mais tarde persuadiu-se de que seria o filho a cumprir a profecia, pois um cometa foi visto no céu de Porto Real na noite em que Aegon foi concebido, e Rhaegar tinha certeza de que a estrela sangrando era um cometa.” (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 447).


ou ainda:

“– Sim. – A mulher levantou-se num turbilhão de seda escarlate, com os longos cabelos acobreados caindo em volta de seus ombros. – As espadas, sozinhas, não podem deter esta escuridão. Só a luz do Senhor consegue fazer isso. Não se iludam, bons sores e valentes irmãos, a guerra que viemos travar não é uma querela mesquinha a propósito de terras e honrarias. A nossa é uma guerra pela própria vida, e se falharmos o mundo morre conosco.
Sam viu que os oficiais não sabiam como entender aquilo. Bowen Marsh e Othell Yarwyck trocaram um olhar de dúvida, Janos Slynt estava furioso e Hobb Três-Dedos tinha a expressão de quem preferia estar cortando cenouras naquele momento. Mas todos pareceram surpreendidos ao ouvir Meistre Aemon murmurar:
“– A guerra de que fala é a guerra pela alvorada, senhora. Mas onde está o príncipe que foi profetizado? (no original, prometido)
– Ele está na sua frente – declarou Melisandre –, embora não tenha olhos para ver. Stannis Baratheon é Azor Ahai regressado, o guerreiro do fogo. Nele, as profecias cumprem-se. O cometa vermelho ardeu no céu para anunciar a sua vinda, e ele traz a Luminífera, a espada vermelha dos heróis.” (MARTIN, George R. R. Samwell V. A Tormenta de Espadas. São Paulo: Leya, 2011, cap. 78. Tradução de Jorge Candeias.)


Então sabemos que Azor Ahai e o Príncipe Prometido se referem ao mesmo “mito” e profecia e que Rhaegar tinha conhecimento disso pois o próprio meistre Aemon, acreditava que ele era o herói profetizado, e durante um tempo, o próprio Rhaegar compartilhou dessa crença.

A) A sombra de Solarestival

Para entendermos a relação de Rhaegar com a profecia do Príncipe que foi Prometido, temos que levar em consideração dois fatores essenciais de sua caracterização: a relação dos Targaryen com as profecias e o momento de seu nascimento.

A Casa Targaryen é a única casa remanescente das 40 famílias que dominavam Valíria e estavam ligados aos dragões. A salvação da família ocorreu porque Daenys, a Sonhadora; tivera um sonho profético, no qual toda Valíria era destruída. Assim, sob muita chacota de seus conterrâneos, os Targaryen partiram de Valíria e se estabeleceram em Pedra do Dragão, que há muito tempo já era um interposto valiriano no ultramar.

O desdobramento desses eventos todos conhecemos: Valíria desapareceu em um mar de chamas, os Targaryen e seus dragões prosperaram em Pedra do Dragão e com Aegon, o Conquistador e suas irmãs/esposas, Visenya e Rhaenys, estabeleceram uma dinastia que durou quase 300 anos em Westeros.

Toda a linhagem fora salva devido a um sonho profético, os chamados sonho de dragão, algo que se repetiu durante as infinitas gerações que sucederam Daenys, a Sonhadora.

“– O último dragão morreu antes de ter nascido – Sam respondeu. – Como é possível que se lembre dele?
– Vejo-os nos meus sonhos Sam. Vejo uma estrela vermelha a sangrar no céu. Ainda me lembro do vermelho. Vejo suas sombras na neve, ouço o estalar de asas de couro, sinto o seu bafo quente. Meus irmãos também sonhavam com dragões, e os sonhos mataram todos eles. Sam, nós estremecemos à beira de profecias meio recordadas, de maravilhas e terrores que nenhum homem vivo hoje pode esperar compreender…” (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 331).


A própria Daenerys teve um sonho de dragão, de natureza profética e perturbadora, tempos antes de entrar na pira de Drogo e chocar seus ovos de dragão.

“Como que em resposta, ouviu um hediondo som de rasgar e o crepitar de um grande fogo. Quando voltou a olhar, Viserys tinha desaparecido, grandes colunas de chamas erguiam por toda parte e no meio delas, estava o dragão. Virou lentamente a grande cabeça. Quando os olhos fendidos do animal encontraram os dela, Dany acordou, tremendo e coberta por uma fina película de suor. Nunca tivera tanto medo…” (A Guerra dos Tronos, Daenerys, p.77).


Este padrão de sonhos sobrenaturais de natureza profética, explica porque os Targaryen são essencialmente, tão ligados à profecias, ao ponto de levá-las extremamente a sério.

No entanto, desde a morte do último dragão, ocorrida durante o reinado de Aegon III, os Targaryen se lançaram numa verdadeira corrida para trazer os dragões de volta. Levando para Westeros, feiticeiros, umbromantes e alquimistas dos diferentes cantos do mundo.

Sem sucesso, os dragões ficaram desaparecidos por mais de 100 anos e neste meio tempo, muitos Targaryen morreram de forma trágica enquanto tentavam trazê-los de volta, pois eram atormentados pelos sonhos de dragão e porquê acreditavam que um dia eles retornariam… e certamente conheciam a profecia do Príncipe que foi prometido.

“Egg abaixou a voz. – Algum dia os dragões irão voltar, meu irmão Daeron sonhou com isso, e o Rei Aerys leu na profecia. Talvez seja meu ovo que vai eclodir. Isso seria esplêndido.” (MARTIN, George RR O Cavaleiro Misterioso. O Cavaleiro dos Sete Reinos. São Paulo: Leya, 2014.)




Incêndio em Solarestival e o nascimento de Rhaegar Targaryen (Foto: O Mundo de Gelo e Fogo)

Ao final de sua vida, provavelmente devido aos sonhos de dragão, Aegon V (Egg) ficou obcecado em trazer os dragões de volta, de modo que ele pudesse colocar em curso as reformas que queria fazer para beneficiar as classes mais baixas de Westeros. Aproveitando para comemorar o nascimento de seu bisneto (Rhaegar) que estava bem próximo, ele decidiu reunir praticamente toda a linhagem principal da família Targaryen em Solarestival, e contratou feiticeiros vindo de Asshai para tentar chocar os ovos de dragão que ele tinha e os que estava em Pedra do Dragão. Solarestival há muito era uma importante mansão frequentemente usada pela Casa Targaryen e ficava localizada nas terras da tempestade.

Ninguém sabe exatamente como, mas as chamas saíram completamente de controle e mataram praticamente quase toda a linhagem principal da família, inclusive o rei e o Senhor Comandante da Guarda Real; Duncan, o Alto (os protagonistas da série de contos, O Cavaleiro dos Sete Reinos).

Apesar da tragédia, é dito na história que Solarestival era o local favorito de Rhaegar. Um lugar para aonde ele se refugiava munido apenas de sua harpa. Voltaremos a falar sobre isso com mais calma nos próximos capítulos.



B) Aegon, o Improvável

Aegon V, também conhecido como Egg, ficou conhecido na história como Aegon, o Improvável. Isso porque ele estava extremamente longe da linha de sucessão do trono, sendo o quarto filho de um quarto filho. Porém, após uma série de tragédias dentro da linhagem principal, ele ascendeu ao Trono de Ferro em 233 d.c.

Como sempre esteve longe da linha de sucessão, Egg desfrutou de uma vida no mínimo interessante. Com apenas 10 anos, ele tornou-se escudeiro de Sor Duncan, o Alto; e com ele viajou por toda Westeros e além, vivendo uma série de aventuras. Evidentemente que tomando cuidado para que sua verdadeira identidade principesca não fosse descoberta.

Assim, Egg entrou em contato direto com o drama vivido pelos camponeses do continente e quando tornou-se rei, tentou estabelecer uma série de medidas que beneficiasse as camadas mais baixas da população westerosi.

Suas políticas criaram uma série de tensão com a nobreza, o que ele tentou compensar através de políticas de casamentos. O que não deu muito certo, pois com exceção de Rhaelle, todos os seus filhos fizeram como ele e se casaram por amor ou não casaram, a exemplo de Daeron.

Por ter estado tão longe da linha de sucessão, foi permitido a Egg casar-se com Bertha Blackwood, também conhecida como Bertha Negra devido os seus longos cabelos escuros. Os Blackwood são uma casa relativamente pequena para compor a linha dinástica principal, porém o casamento de Egg e Bertha não levantou resistência devido a distância entre ele e o Trono de Ferro no momento da união.

Um adendo: a Casa Blackwood descende dos primeiros homens, pois inicialmente era uma casa nortenha, que devido a conflitos no norte, foi expulsa e se estabeleceu nas terras fluviais. Porém, ela é a mesma casa de Bryden River, filho bastardo do rei Aegon IV com Mylessa Blackwood. Bryden River, conhecido como Corvo de Sangue, é também o Corvo de Três Olhos de Bran. Isso é interesse pois é a herança genética dos primeiros homens entrando na linhagem principal da Casa Targaryen, muito antes de Jon Snow. Rhaegar, Daenerys e Viserys carregam também no sangue uma parte da herança genética dos primeiros homens, graças ao casamento despretensioso de Egg com Bertha Negra.


Genéticas a parte, o filho mais velho do casal, Ducan, renunciou o seu direito de sucessão para casar-se com Jeny de Pedrasvelha, quando ele a conheceu nas terras fluviais e ela chegou a corte acompanhada de uma misteriosa anã, que Jeny dizia ser uma filha da floresta, mas que na verdade pode ser uma vidente verde, assim como Bryden River. Falaremos mais dessa anã adiante.

Com a renúncia de Duncan, Jaehaerys herdou o Trono de Ferro, mas antes disso casou-se escondido com sua irmã, Shaera, e ambos consumaram o casamento antes que Aegon pudesse fazer algo a respeito da união dos dois. Rhaelle casou-se com Osmund Baratheon, porém, por hora, quero chamar atenção para o papel de Jaehaerys no destino de Rhaegar.

Jaehaerys teve dois filhos com sua irmã, Aerys e Rhaella Targaryen, e depois de ouvir da anã que Jeny levou para corte, que o Príncipe Prometido nasceria de sua linhagem, casou seus dois filhos contra a vontade de ambos. Jaehaerys é um claro exemplo do quão os Targaryen são ligados à profecias e o quanto eles acreditavam na profecia do Príncipe que foi Prometido e muito provavelmente, no retorno dos dragões.

Jaehaerys casou seus dois únicos filhos, muito provavelmente para não correr o risco de ter a profecia se cumprindo fora da linhagem principal. Dessa união infeliz e exatamente no dia da tragédia de Solarestival, Rhaegar veio ao mundo entre sal (das lágrimas) e fumaça (do incêndio), alimentando a crença de meistre Aemon de que ele era o Príncipe Prometido.

Esse fato provavelmente moldou toda a vida de Rhaegar. Como ele gostava mais de livros do que espadas, é provável que tenha entrado em contato com antigas anotações sobre profecias e dragões dos reis Targaryen, inclusive de Aegon V, seu bisavô. Sem contar a influência de meistre Aemon e o modo como a tragédia de Solarestival exerceu impacto sobre sua personalidade e o modo como ele viveu.

“– Quando criança, o Príncipe de Pedra do Dragão era extraordinariamente dado á leitura. Começou a ler tão cedo que os homens diziam que a Rainha Rhaella devia ter engolido alguns livros e uma vela enquanto ele estava em seu ventre. Rhaegar não tinha nenhum interesse pelas brincadeiras das outras crianças. Os meistres ficavam assombrados com sua inteligência, mas os cavaleiros do pai trocavam gracejos amargos sobre Baelor, o Abençoado, ter renascido. Até que um dia o Príncipe Rhaegar encontrou algo em seus pergaminhos que o mudou. Ninguém sabe o que pode ter sido, só se sabe que o garoto apareceu no pátio uma manhã, no momento em que os cavaleiros vestiam as armaduras. Foi direto a Sor Willem Darry, o mestre de armas, e disse: “Vou precisar de espada e armadura. Parece que tenho que ser um guerreiro.” (A Tormenta de Espadas, Daenerys, p. 89)


Por mais de 15 anos, Rhaegar foi o último de sua linhagem pois conforme explicitado No Mundo de Gelo e Fogo, até o nascimento de Viserys em 276 d.c, Rhaella sofrera uma série de abortos e deu a luz a filhos natimortos ou que morriam tempos depois.

Sem ter uma irmã para se casar conforme o desejo de seu pai cada vez mais doente mentalmente, Rhaegar casou-se com Elia Martell e quando concebeu seu segundo filho com ela, Aegon, passou acreditar que a criança era o Príncipe Prometido.

“– Ele partilhou minha crença quando era mais novo, mas mais tarde persuadiu-se de que seria o filho a cumprir a profecia, pois um cometa foi visto no céu de Porto Real na noite em que Aegon foi concebido, e Rhaegar tinha certeza de que a estrela sangrando era um cometa.” (O Festim dos Corvos, Samwell, p. 447).



C – O dragão tem três cabeças

Aqui podemos falar da enigmática frase “O dragão tem três cabeças”, ouvida por Dany na Casa dos Imortais, num dos poucos vislumbres de Rhaegar durante toda a história.


– Aegon – ele disse para a mulher que amamentava um recém nascido numa grande cama de madeira – Que nome seria melhor para um rei?

-Fará uma canção para ele?- a mulher perguntou.
-Ele já tem uma canção. É o príncipe que foi prometido, e é a sua canção de gelo e fogo – ergueu o olhar quando disse aquilo, e seus olhos encontraram os de Dany, e pareceu que a via ali em pé através da porta. – Terá de haver mais um – ele disse, embora Dany não soubesse dizer se estava falando para ela ou para a mulher na cama. – O dragão tem três cabeças… (Daenerys, A Fúria dos Reis; pág 452)


Falada aparentemente após o nascimento de Aegon em Pedra do Dragão , essa frase cria um verdadeiro reboliço nos fóruns, pois sugere que Rhaegar acreditava que deveria ter três filhos, uma vez que o símbolo da Casa Targaryen é um dragão de três cabeças representando Aegon, o Conquistador, e suas duas irmãs/esposas, Visenya e Rhaenys.



Rhaegar Targaryen e Rhaenys (e seu gatinho, Balerion)

Rhaenys era o nome da primeira filha de Rhaegar com Elia e Aegon, o nome de seu segundo filho, e aparentemente, o filho que ele acreditava ser a cabeça principal. Aqui, fica subentendido pela narrativa que o dragão de três cabeças e o Príncipe Prometido seriam a mesma entidade, então o príncipe nascendo da linhagem Targaryen, ele seria três pessoas, logo: seus filhos.

Porém, um pouco depois após o difícil parto de Aegon em Pedra do Dragão, Rhaegar foi informado que Elia não mais poderia gerar filhos, pois isso poderia significar a sua morta. Ela já tinha sofrido durante o parto de Rhaenys. Dias depois, que não sabemos exatamente quantos, Rhaegar desapareceu com Lyanna Stark nas terras fluviais, caso esta cronologia esteja correta.

Aqui percebemos que sobreposto a uma percepção de Rhaegar “estuprador” ou de um “Rhaegar apaixonado”, existe um terceiro motivo, uma terceira camada: a de um Rhaegar que existiu para cumprir o seu destino. Que existiu para cumprir profecia do Príncipe que foi Prometido.

Então vamos voltar mais uma vez a profecia do Príncipe que foi prometido.

Quando a estrela vermelha sangra e as trevas reúnem forças, Azor Ahai renascerá por entre fumaça e sal, para acordar dragões da pedra. (A Tormenta de Espadas, Davos, cap. 25)

E a essa fala de Sor Barristan à Daenerys:


– Capaz. Isso acima de tudo. Determinado, circunspecto, cumpridor, obstinado. (Daenerys; A Tormenta de Espadas)

Capaz, determinado, cumpridor, circunspecto e obstinado, qualidades ou defeitos de um homem que com certeza seria capaz de qualquer coisa para atingir seus objetivos, mesmo que isso significasse manchar a sua honra, condenar sua casa e violentar uma garota inocente ou mesmo fazê-la amá-lo, para conseguir sua terceira cabeça do dragão.

Quando você junta todas as pistas sobre Rhaegar, é a essa conclusão que se chega. Com consentimento ou sem consentimento, a profecia do Príncipe Prometido movera Rhaegar. A terceira cabeça do dragão movera Rhaegar. A Canção de Gelo e fogo movera Rhaegar. Ele precisava de Lyanna, ele precisava ter Jon, ele precisava ter sua canção de gelo e fogo.

Bom, aqui as coisas ficam estranhas. Aqui acho que estamos cometendo algum tipo de engano talvez. Primeiro, não existe informações suficientes sobre as motivações de Rhaegar, somente fragmentos que chegam para nós em forma de quebra cabeça. Existem três histórias possíveis e talvez a resposta seja uma amalgama delas ou mesmo nenhuma das três. Se a conclusão fosse simples assim, não haveria tanto mistério e tanto cuidado do autor em segurar a verdadeira história de Rhaegar e Lyanna por cinco livros, mesmo ele sendo o principal motivo para o segredo da maternidade de Jon.

Se sabemos pouco sobre Rhaegar, sabemos menos ainda sobre Lyanna e Elia. Enquanto Elia é tachada como fracassada por não ter agradado seu príncipe dragão e permitido a ele fazer o que fez por ter sido uma esposa fraca e doente, Lyanna é simplesmente reduzida ao “gelo” da relação que gerou Jon Snow. Acho que não é bem assim e espero conseguir dá uma visão mais efetiva do papel que Lyanna e Elia podem ter desempenhado.

Por fim, tentei demonstrar nessa parte que a aparente “obsessão” de Rhaegar por profecias, algo que ele é frequentemente acusado, é na verdade uma características dos Targaryen em si, tendo em vista que eles foram salvos por um sonho profético que os livrou da perdição de Valíria. Assim, eles são essencialmente ligados à profecias (basta olhar a Daenerys), a ponto de um rei casar seus únicos dois filhos ao ouvir de uma anã “desconhecida” que o Príncipe Prometido nasceria de sua linhagem. Desta forma, mas do que um simplesmente obcecado, Rhaegar foi moldado pelo próprio meio cultural que ele se desenvolveu. Como Targaryen, ele supostamente acreditava nas profecias e na magia e por anos ele carregou sozinho o peso de ser o último de uma linhagem quase à beira da extinção. Meistre Aemon acreditava na profecia e não o chamamos de obcecado e tão pouco Melisandre. No caso dessa última, dizemos que ela tem boas intenções, ainda que ela esteja causando um estrago considerável na vida de Stannis Baratheon em nome de sua causa.  Deste modo, acho injusto atribuir o rótulo de "obcecado" a Rhaegar, ainda mais quando sabemos tão pouco sobre ele. Sua aproximação com a profecia, uma crença compartilhada por outros Targaryen, parece muito mais algo que vem do meio onde ele foi criado, do que pura e simples fixação.  

Vale lembrar que declarações recentes de Martin, deixaram no ar se o próprio processo de conquista de Aegon, o Conquistador, não tenha tido por base o conhecimento que os valirianos detinham sobre a Longa Noite. Embora seja especulação, Westeros  de fato era conhecida como o “fim do mundo” pelos Valírianos. Eles se mostraram interessados no local e Pedra do Dragão é um indicio, mas nunca conquistaram. O interesse sempre pareceu ser mais sombrio. Aegon faz parte da quinta geração de Targaryen que nasceram em Pedra do Dragão, ele está mais próximo de Valíria do que da Guerra dos Tronos. Não seria estranho se esses primeiros Targaryen tivessem carregado com eles informações sobre um herói que renasceria para salvar o mundo. A profecia de Azor Ahai é conhecida há cinco mil anos. Não me espantaria que tenha sido dessa forma que Aerys I, um rei que foi mais interessado em livros empoeirados sobre profecia e mistérios do mundo do que qualquer outra coisa, tenha topado com antigos escritos valirianos sobre Azor Ahai/Príncipe que foi prometido. Aerys I e meistre Aemon foram contemporâneos e tinham em comum o gosto por coisas de meistres. Meistre Aemon acreditava que Rhaegar era essa figura profética.

Também não seria estranho se descobríssemos que o próprio Rhaegar era atormentado pelos mesmo sonhos de dragão que perturbavam Daenerys, meistre Aemon e seus irmãos. Rhaegar ficou conhecido na história dos Sete Reinos como o último dragão. Talvez incutido nisto tenha algo mais poderoso do que o fato dele ter sido por um longo tempo o último de sua linhagem. Para além de uma tristeza que marcou o momento de seu nascimento em Solarestival, os sonhos poderiam ser um dos motivos para sua aparente melancolia. Ou algo a mais, que falaremos mais adiante.


Postado originalmente por mim em nomeumundo.com 



Por Luciana Gomes (Rhaenys)

Comentários

  1. Parabéns pelas análise é a melhor que já li até agora , eu também acho que tudo que levou e motivou rhaegar lyanna é muito complexo e é muito mais que os dois lados explicam .

    ResponderExcluir

Postar um comentário

Postagens mais visitadas